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Teubner 3: autodestruicao do sistema de governação (estado do direito e qualidade de vida, '''korruption''', v-leute, provokateure, proaktive überwachung und verfolgung, gefängnisse, legalität, prop., akzess., bestimmtheit, grund dafür prävention stattt freiheit, modernes strafrecht)
Teubner 3: autodestruicao do sistema de governação (estado do direito e qualidade de vida, '''korruption''', v-leute, provokateure, proaktive überwachung und verfolgung, gefängnisse, legalität, prop., akzess., bestimmtheit, grund dafür prävention stattt freiheit, modernes strafrecht)
Maria Lucia Karam:
*A Lei reafirma a '''antecipação''' do momento criminalizador da produção e da distribuição das drogas qualificadas de ilícitas, seja abandonando as fronteiras entre consumação e tentativa, com a tipificação autônoma de condutas como sua posse, transporte ou expedição, seja com a tipificação autônoma de atos preparatórios, como o cultivo de plantas ou a fabricação, fornecimento ou simples posse de matérias primas, insumos ou produtos químicos destinados à sua preparação, ou mesmo a fabricação, transporte, distribuição ou simples posse de equipamentos, materiais ou precursores a serem utilizados em sua produção. A criminalização antecipada viola o princípio da lesividade da conduta proibida, assim violando a cláusula do devido processo legal, de cujo aspecto de garantia material se extrai o princípio da proporcionalidade expressado no princípio da lesividade.
O princípio da proporcionalidade também é violado na equiparação do fornecimento gratuito ao “tráfico”. A Lei 11.343/06 insiste em apenas distinguir a conduta de quem eventualmente oferece droga qualificada de ilícita, sem objetivo de lucro, a pessoa de seu relacionamento, para um consumo conjunto, conduzindo à esdrúxula situação de se tratar como “traficante” quem oferece ou fornece, mas não pretende consumir. Parece um incentivo ao consumo, que, paradoxalmente, permanece criminalizado na vaga tipificação da indução, instigação ou auxílio ao uso.
A Lei 11.343/06 repete a Lei 6.368/76 ao prever a “associação” específica para o “tráfico” de drogas qualificadas de ilícitas e traz como inovação a tipificação, como figuras autônomas, do financiamento ou custeio do “tráfico”. A violação ao princípio da proporcionalidade aqui se revela não apenas na figura da associação, que, como todos os tradicionais tipos de crimes de conspiração, quadrilha e outros assemelhados, criminalizam meros atos preparatórios, mas também, sob outro aspecto, na previsão como tipos autônomos do financiamento ou do custeio, que, inseridos no âmbito do próprio tipo do “tráfico”, poderiam, no máximo, funcionar como circunstâncias agravantes da pena àquele cominada.
A violação ao princípio da proporcionalidade se revela também nas penas delirantemente altas, previstas para essa indevidamente criada figura autônoma: reclusão de 8 a 20 anos, a pena mínima sendo assim superior à prevista para um homicídio. A ânsia repressora é tal que a Lei 11.343/06, ignorando a vedação do bis in idem, ainda inclui os mesmos financiamento ou custeio dentre as qualificadoras do “tráfico”.
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Na cominação das penas de multa para os tipos de crimes identificados ao “tráfico”, a Lei 11.343/06 exacerba seus valores, afastando-se das regras gerais do Código Penal. Assim, mais uma vez viola o princípio da isonomia, não havendo qualquer razão para diferenciar o “tráfico” de outras condutas criminalizadas em que o agente igualmente se move pela busca de proveito econômico.
Em matéria processual, a supressão de direitos fundamentais logo surge no dispositivo da Lei 11.343/06 que veda a liberdade provisória. Assim repetindo regra indevidamente introduzida pela Lei 8.072/90, a Lei 11.343/06, negando a natureza cautelar da prisão imposta no curso do processo, repete a violação à garantia do estado de inocência. Reproduzindo regra do Código de Processo Penal que condiciona a admissibilidade de recurso interposto contra a sentença condenatória ao recolhimento à prisão do réu que não ostente primariedade e bons antecedentes, a Lei 11.343/06, além de insistir na extração de efeitos gravosos da reincidência, além de repetir a violação à garantia do estado de inocência, ainda viola a garantia do acesso ao duplo grau de jurisdição.
A Lei 11.343/06 refere-se expressamente à infiltração e à ação controlada de agentes policiais e reafirma a delação premiada ao se referir também expressamente aos “colaboradores”. Juntando-se à quebra do sigilo de dados pessoais, à interceptação de correspondências e de comunicações telefônicas, às escutas e filmagens ambientais, previstas em outros diplomas que, integrando a legislação brasileira de exceção, permanecem aplicáveis a hipóteses de acusações por alegado “tráfico” de drogas qualificadas de ilícitas, esses insidiosos, indevidos e ilegítimos meios de busca de prova objetivam fazer com que, através do próprio indivíduo, se obtenha a verdade sobre suas ações tornadas criminosas. As regras que os prevêem assim violam direta ou indiretamente a garantia do direito a não se auto-incriminar.
A Lei 11.343/06 mantém a criminalização da posse para uso pessoal das drogas qualificadas de ilícitas, apenas afastando a cominação de pena privativa de liberdade, para prever penas de advertência, prestação de serviços à comunidade, comparecimento a programa ou curso educativo e, em caso de descumprimento, admoestação e multa. Não traz assim nenhuma mudança significativa, na medida em que, dada a pena máxima de detenção de 2 anos prevista na Lei 6.368/76, a indevidamente criminalizada posse para uso pessoal já se enquadrava na definição de infração penal de menor potencial ofensivo, a que aplicável a imposição antecipada e “negociada” de penas não privativas da liberdade.
Mantendo a criminalização da posse para uso pessoal, a Lei 11.343/06 repete as violações ao princípio da lesividade e às normas que, assegurando a liberdade individual e o respeito à vida privada, se vinculam ao próprio princípio da legalidade, que, base do Estado de direito democrático, assegura a liberdade individual como regra geral, situando proibições e restrições no campo da exceção e condicionando-as à garantia do livre exercício de direitos de terceiros.
A simples posse para uso pessoal das drogas qualificadas de ilícitas, ou seu consumo em circunstâncias que não envolvam um perigo concreto, direto e imediato para terceiros, são condutas que não afetam nenhum bem jurídico alheio, dizendo respeito unicamente ao indivíduo, à sua intimidade e às suas opções pessoais. Não estando autorizado a penetrar no âmbito da vida privada, não pode o Estado intervir sobre condutas de tal natureza. Enquanto não afete concretamente direitos de terceiros, o indivíduo pode ser e fazer o que bem quiser.
Essa rápida análise da nova lei especial brasileira em matéria de drogas já sinaliza que as reflexões suscitadas por sua edição não devem se esgotar no exame de seus novos ou repetidos dispositivos. As reflexões devem avançar e colocar em pauta o repúdio à repressão e a afirmação da liberdade, revelando os riscos, os danos e os enganos globalmente produzidos pelo proibicionismo, questionando o discurso que oculta fatos, demoniza substâncias e pessoas, molda opiniões conformistas e imobilizadoras, censura e desinforma, entorpecendo a razão.
As sistemáticas violações a princípios e normas das declarações universais de direitos e das Constituições democráticas, que, presentes na nova lei brasileira, reproduzem as proibicionistas convenções internacionais e as demais legislações internas criminalizadoras da produção, da distribuição e do consumo das drogas qualificadas de ilícitas, já demonstra que os riscos e danos relacionados a tais substâncias não provêm delas mesmas. Os riscos e danos provêm sim do proibicionismo. Em matéria de drogas, o perigo não está em sua circulação, mas sim na proibição, que, expandindo o poder punitivo, superpovoando prisões e suprimindo direitos fundamentais, acaba por aproximar democracias de Estados totalitários.
Além de ocultar os riscos e danos à democracia, o discurso proibicionista oculta também o fato de que a proteção da saúde pública, que estaria a formalmente fundamentar a criminalização das condutas relacionadas às drogas qualificadas de ilícitas, é afetada por esta mesma criminalização, que impede um controle de qualidade das substâncias entregues ao consumo, impõe obstáculos a seu uso medicinal, dificulta a informação e a assistência, cria a necessidade de aproveitamento de circunstâncias que permitam um consumo que não seja descoberto, incentivando o consumo descuidado ou anti-higiênico propagador de doenças como a aids e a hepatite.
Além de ocultar os riscos e danos à democracia, além de ocultar os riscos e danos à saúde pública, o discurso proibicionista oculta ainda o fato de que, com a intervenção do sistema penal sobre as condutas de produtores e distribuidores das substâncias e matérias primas proibidas, o Estado cria e fomenta a violência, que só acompanha suas atividades econômicas porque o mercado é ilegal.
Conclusão
Já é hora de romper com o proibicionismo e promover uma mobilização global que conduza a uma ampla reformulação das convenções internacionais e das legislações internas, para legalizar a produção, a distribuição e o consumo de todas as substâncias psicoativas e matérias primas para sua produção, regulando-se tais atividades com a instituição de formas racionais de controle, verdadeiramente comprometidas com a saúde pública, respeitosas da dignidade e do bem-estar de todos os indivíduos, livres da danosa intervenção do sistema penal.




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